DEMOCRACIA ATENIENSE
ATENAS foi a primeira cidade
politicamente organizada que teve como modelo de governo a DEMOCRACIA
(vulgarmente, demos = povo + cracia = governo, poder). Era uma forma
de organização política bem diferente das democracias atuais (em sua maioria
indiretas ou representativas), pois na polis grega, cidadão seria o sujeito
ateniense, do sexo masculino e maior de 21 anos. Mulheres, jovens, estrangeiros
e escravos estavam excluídos da participação política. O cidadão detinha o
direito de VOTO (decisão sobre os assuntos públicos), o direito à palavra
(isegoria = todos podiam discursar ou falar na ÁGORA = praça pública) e
igualdade perante a lei (isonomia = todo cidadão era considerado igual perante
a lei, daí as representações da justiça e das divindades a ela relacionadas
como cega, com uma espada de dois gumes e com uma balança, representando a não
acepção de pessoas, que cortava de ambos os lados indistintamente e buscava o
equilíbrio e a reparação nas contendas judiciais). Em tal contexto, as
HABILIDADES ARGUMENTATIVAS e DIALÉTICAS (de diálogo = razão de dois, ou
oposição de ideias) passaram a ser fundamentais. Emerge então um clima que será
ideal para a ascensão dos SOFISTAS e SÓCRATES, como exímios mestres na arte de
argumentar. O DEBATE EM PRAÇA PÚBLICA era fundamental para o sucesso político e
filosófico.
SOFISTAS: A RETÓRICA
A grande preocupação dos SOFISTAS
é com o homem e sua virtude. Deslocam o interesse da filosofia da natureza para
o ser humano e por isso inauguram a antropologia (estudo do homem). Instauraram
um clima cultural que se poderia chamar com o moderno termo iluminista (a luz
da razão é quem deve guiar o ser humano e arrancá-lo das trevas da fé, dos
mitos e da religião). Criticaram a religião pela primeira vez em perspectiva
também atéia (não há deus ou deuses). Criticaram o conceito de verdade e de
bem. Destruíram a imagem tradicional do ser humano como ser especial,
privilegiado e excelso. Consideraram a virtude como objeto de ensino.
Apresentaram-se como mestres de virtude e foram a expressão da crise da
aristocracia (governo dos melhores, no caso ateniense, as elites agrárias) e da
ascensão política das novas classes, principalmente urbanas e ligadas ao
comércio. Os SOFISTAS (sábios, mestres na arte da retórica e da oratória) foram
filósofos que começaram a se destacar no contexto do florescimento da
DEMOCRACIA ATENIENSE, revelando-se grandes debatedores, que sobressaíam na
ágora ateniense pela forma de conduzir as exposições verbais. A RETÓRICA, ou
ORATÓRIA, é a arte de falar bem. Segundo os SOFISTAS, é possível convencer
qualquer um de qualquer coisa, bastando somente saber usar as palavras
corretas. Vendiam seu saber aos filhos da elite econômica de ATENAS e ensinavam
a EXPOSIÇÃO e o MONÓLOGO (mono=um + logo=palavra – palavra proferida por um
indivíduo no parlatório da praça pública) como forma de convencer seus
interlocutores. A grande preocupação dos SOFISTAS era desenvolver em seus
alunos a capacidade de ARGUMENTAÇÃO e o conhecimento de DOUTRINAS DIVERGENTES,
uma vez que, segundo tais mestres, não existia uma verdade absoluta, portanto,
era possível defender qualquer posição de modo plausível e convincente, sem se
importar com a veracidade dos argumentos, desde que se dominassem os recursos
da arte RETÓRICA. Desenvolviam com seus discípulos JOGOS DE PALAVRAS,
RACIOCÍNIOS CAPCIOSOS e CONCEPÇÕES ABSURDAS para conseguir levar seus
auditórios a aderir e concordar com suas argumentações. Defendiam veementemente
posições RELATIVISTAS (tudo é relativo e não há conhecimento, princípio ou
comportamento correto, certo e seguro).
HERÓIS OU VILÕES?
Durante muito tempo os SOFISTAS
foram considerados vilões, uma categoria inferior de filósofos, devido ao fato
de tais pensadores terem enveredado pelo campo do relativismo e por não terem
se preocupado com a questão da verdade, da justiça e do bem, afirmando serem
tais conceitos meras convenções humanas, sem valor absoluto. Tal depreciação se
deveu em muito a SÓCRATES, PLATÃO e ARISTÓTELES, que repassaram para a
posteridade uma visão extremamente negativa de tais filósofos. Atualmente seu
valor foi resgatado por estudiosos contemporâneos, que reabilitaram os estudos
sobre os SOFISTAS e perceberam o valor e a profundidade das concepções por eles
elaboradas. Seu estudo se mostra importante e amplamente utilizado em várias
áreas ao longo da história e atualmente, como a política, a religião, o
direito, o marketing, a publicidade e a propaganda. Portanto, a posição mais
aceita hoje sobre os SOFISTAS é de que eles não foram nem heróis, nem vilões,
mas pensadores fundamentais no processo de compreensão da arte de argumentar e
convencer, tanto para utilizar tais recursos, quanto para desvelar tentativas
capciosas de convencimento. Mas os adjetivos depreciativos ficaram e hoje
SOFÍSTICA significa a arte de manipular raciocínios e SOFISMA é um argumento
aparentemente correto, mas que na realidade é falso e utilizado com o único
intuito de enganar, ludibriar e passar alguém para trás.
PROTÁGORAS DE ABDERA
Segundo PROTÁGORAS (480-410 a.
C.): “O HOMEM É A MEDIDA DE TODAS AS COISAS”, ou seja, cada cabeça possui uma
sentença, não havendo possibilidade de se chegar a uma verdade universal. O que
é verdade para um, pode não ser verdade para outro. O que é justiça para
alguém, pode não ser justiça para outra pessoa. O que é o bem para fulano, pode
não ser bem para beltrano e assim por diante. Cada indivíduo é único e possui a
sua própria medida para a realidade que o envolve. Por defender tal posição,
seu pensamento foi denominado subjetivismo (tudo depende do sujeito que julga e
mede conforme suas medidas e percepções). A única medida aceitável em comum
entre os indivíduos deve ter como critério o que é útil. A virtude é a força da
razão com a qual pode-se tornar forte o argumento mais fraco (antilogia = oposição
de palavras contraditórias) e buscar o útil da cidade.
GÓRGIAS DE LEONTINI
GÓRGIAS (487-380 a. C.) foi um
defensor do CETICISMO ABSOLUTO (tudo é incerto e duvidoso e não há parâmetros
universais para qualquer julgamento ou conhecimento). Afirmava que o ser não
existe, mas que mesmo se existisse, não se poderia conhecê-lo e mesmo que fosse
possível conhecê-lo, jamais poderia ser comunicado. É também considerada a
primeira forma de niilismo (nihil no
latim, que quer dizer nada, ou seja, coisa alguma tem sentido, sequer
existência). A virtude é a RETÓRICA, ou seja, a capacidade de usar a palavra e
o discurso e de desfrutar a capacidade de sugestão e de persuasão com fins
próprios, sem levar em consideração verdades absolutas.
PRÓDICO DE CÉOS
O bem, o mal e a moral são
interpretados em chave utilitarista, ou seja, bem, mal e moral é aquilo que é
útil para o indivíduo ou para a cidade. A virtude é o conhecimento da arte da
sinonímia (conhecer os sinônimos das palavras para aumentar o arsenal
argumentativo), que permite encontrar os sinônimos para tornar os discursos
mais convincentes.
HÍPIAS E ANTIFONTE
A verdade e o bem é aquilo que
está conforme à lei de natureza (a ordem que rege o cosmo). Opinião é aquilo
que está conforme à lei positiva (a ordem convencionada pelos seres humanos).
Enquanto a primeira oferece firme referência ética e leva ao igualitarismo, a
segunda leva às discriminações entre os homens. Fundam então os conceitos de
lei de natureza e lei positiva, que serão as matizes dos debates jurídicos
modernos e contemporâneos entre os jusnaturalistas e os defensores do
positivismo jurídico. A virtude seria viver segundo a natureza.
ERÍSTICOS E SOFISTAS-POLÍTICOS
ERÍSTICA é a arte da controvérsia
com palavras que tem por fim a controvérsia em si mesma. Tanto os ERÍSTICOS,
quanto os SOFISTAS-POLÍTICOS foram os responsáveis pela dessacralização (perda
do caráter sagrado) da religião. Fizeram uso instrumental (instrumento de
dominação) e ideológico (ideias da classe dominante utilizadas para sobrepujar
as classes consideradas inferiores) da retórica, em vista da conquista e
manutenção do poder, adiantando-se assim a MAQUIAVEL. Deformaram a técnica da
antilogia (oposição de palavras e argumentos) para construir sofismas
capciosos. A virtude seria a vontade do mais forte que se impõe sobre o mais
fraco.
SÓCRATES: A DIALÉTICA
O ateniense SÓCRATES (469-399 a.
C.) não deixou nada escrito e tudo que sabemos dele vieram dos registros
deixados por seus discípulos (principalmente PLATÃO, o que abre uma discussão
infindável sobre o que é mesmo SÓCRATES que defendeu e o que é obra de seus
alunos) e antagonistas. Fundou a DIALÉTICA (DIÁLOGO CRÍTICO) junto com os
sofistas. Focou sua filosofia na PROBLEMÁTICA DO SER HUMANO (antropologia). O
ORÁCULO DE DELFOS, certa vez, afirmou ser SÓCRATES o homem mais sábio de toda
GRÉCIA, o que fez com que vários curiosos o procurassem para se edificar. Tal
sentença o fez questionar sobre seu saber, o que o levou à conclusão de que
sabia mais do que os outros porque pelo menos reconhecia que nada sabia (a
famosa frase atribuída a ele: SÓ SEI QUE NADA SEI), diferentemente de seus
adversários que não sabiam, mas acreditavam saber e ser os donos da verdade,
como alguns sofistas. Do mesmo ORÁCULO DE DELFOS tomou para si a inscrição que
havia na entrada do pórtico, que dizia: CONHECE-TE A TI MESMO. Para SÓCRATES, o
conhecimento, a verdade, a justiça e o bem se encontram na alma humana e só é
possível acessá-los quando buscamos conhecer a nós mesmos. Afirmava que não
ensinava a pessoa alguma, apenas assessorava os indivíduos a encontrar a
verdade que habita a consciência de cada um. Outra frase sua famosa é: UMA VIDA
SEM A BUSCA PELO CONHECIMENTO NÃO MERECE SER VIVIDA. E foi assim que viveu toda
sua vida, numa eterna busca pelo saber como forma de dignificar sua própria
existência e a existência de outros.
DEBATE COM OS SOFISTAS
Foi um antagonista dos SOFISTAS,
travando com os mesmo uma batalha em torno das questões relacionadas à verdade,
justiça e bem, que segundo SÓCRATES não poderiam ser abordados por uma vertente
relativista. Afirmava que o ser humano é a sua ALMA, que é a sede da RAZÃO e o
seu EU CONSCIENTE. A alma é a consciência e a personalidade intelectual e
moral, sobretudo razão e conhecimento. O corpo é instrumento da alma. A virtude
(aquilo que torna a alma perfeita) é a ciência e o conhecimento e manifesta-se
como: autodomínio (domínio da razão sobre as paixões); não-violência (a razão
se impõe pela convicção e não pela força); e a liberdade (libertação da parte
racional, que é o verdadeiro homem, em relação à passional), que corresponde à
liberdade interior. O vício (erro, pecado) é ignorância, por isso: ninguém erra
voluntariamente; as diversas virtudes são recondutíveis à unidade (ciência do
bem e do mal) e, também, o vício (ignorância do bem e do mal). Quem conhece o
bem (ética) jamais cometerá o mal.
DIÁLOGO CRÍTICO
A alma se purifica no DIÁLOGO
CRÍTICO (DIALÉTICA) por meio: da IRONIA-REFUTAÇÃO, que é a figura do não saber
para induzir o interlocutor a expor o próprio saber; do metódico disfarce de
assumir as teses do adversário a fim de demonstrar sua falsidade; da refutação,
para fazer o adversário cair em contradição (aporia=dificuldade) e induzi-lo a
deixar as falsas convicções; e da MAIÊUTICA (arte de fazer parir ou dar à luz),
para fazer emergir, mediante perguntas e respostas, a verdade que está em cada
um de nós.
UM CORRUPTOR DA JUVENTUDE?
Foi acusado e condenado à morte
(tomar um veneno mortal chamado cicuta) por supostamente ser INJUSTO COM OS
DEUSES DA CIDADE de Atenas e CORROMPER A JUVENTUDE. Na verdade sua filosofia
incomodou os poderosos da época por seu caráter subversivo e questionador. Teve
a chance de fugir da punição, mas preferiu cumprir a sentença para mostrar o
equívoco da mesma. Morreu defendendo suas posições filosóficas (a imortalidade
da alma), éticas (devemos seguir as leis, mesmo quando injustas, mas sempre
procurando modificá-las para torná-las mais justas) e políticas (a corrupção é
fruto da ignorância e o melhor governo é aquele que busca a sabedoria).
#QUESTÕES FILOSÓFICAS
Como é essencialmente o ser
humano? Como são essencialmente as coisas? O que é o conhecimento verdadeiro?
Como deve ser o governo da cidade? Como devemos viver?
#CONEXÕES
Você acredita que a atitude de
SÓCRATES É UM EXEMPLO A SER SEGUIDO?
#ANÁLISE E ENTENDIMENTO
Em contraste com o período
pré-socrático, marcado por reflexões cosmológicas, qual foi a grande
preocupação do período que se inicia com os sofistas? O que favoreceu o
surgimento dos sofistas? Que relação você pode estabelecer entre a famosa frase
de Protágoras e a concepção de verdade dos sofistas? Quais seriam as
semelhanças e diferenças fundamentais entre Sócrates e os sofistas? Quais foram
as duas grandes fases do diálogo crítico de Sócrates com seus interlocutores? O
que Sócrates fez para ser considerado um elemento perturbador da democracia
ateniense?
#CONVERSA FILOSÓFICA
Qual é o poder da retórica na
sociedade contemporânea?
#CONECTADO
FILOSOFIA - AULA 4 - PARTE 1 - SOFISTAS E
SOCRÁTICOS
PRINCIPAIS IDEIAS DE SÓCRATES
FILOSOFIA - AULA 4 - PARTE 2 - SOFISTAS E
SOCRÁTICOS
Los Sofistas - Filosofía - Educatina
A Vida Examinada Sócrates
Para ler... Mario Sergio Cortella fala sobre
Sócrates
Sócrates
SÓCRATES O GÊNIO DA BOLA
#EXERCÍCIOS
QUESTÃO 1 (Habilidade: Inferir o que foi
apropriado de modo reflexivo.)
Nível de dificuldade: Médio.
Assunto:
Epistemologia.
A reflexão sobre a natureza do nosso
conhecimento dá origem a uma série de desconcertantes problemas filosóficos,
que constituem o tema da teoria do conhecimento, ou epistemologia. Muitos de
seus problemas foram debatidos pelos gregos antigos e, ainda hoje, geram muitas
indagações.
AMORIM,
Maria de Fátima. Filosofia. Ensino
Médio. v. 1. Belo Horizonte: Educacional, 2013.
A
problemática da epistemologia compreende a questão da
(A) compreensão do conhecimento como algo inato.
(B) importância do meio social na definição do
conhecimento.
(C) influência da natureza na compreensão do
mundo.
(D) necessidade da fé aliada à razão no processo
de conhecer.
(E) possibilidade e origem do conhecimento
verdadeiro.
GABARITO: E
Comentário: A epistemologia é uma área da
filosofia que estuda a origem, a estrutura, os métodos e a validade do
conhecimento, conhecida também como teoria do conhecimento e relaciona-se com a
metafísica, a lógica e a filosofia da ciência.
QUESTÃO 2 (Habilidade: Ler textos filosóficos de modo
significativo e inferir o que foi apropriado de modo reflexivo.)
Nível de dificuldade: Médio.
Assunto: Sócrates.
(...) a divindade me incita a partejar os outros,
porém me impede de conceber. Por isso mesmo, não sou sábio, não havendo um só
pensamento que eu possa apresentar como tendo sido invenção de minha alma e por
ela dado à luz. Porém os que tratam comigo, suposto que alguns, no começo pareçam
de todo ignorantes, com a continuação de nossa convivência, quantos a divindade
favorece, progridem admiravelmente, tanto no seu próprio julgamento como no de
estranhos. O que é fora de dúvida é que nunca aprenderam nada comigo; neles
mesmos é que descobrem as coisas belas que põem no mundo, servindo, nisso tudo,
eu e a divindade como parteira.
PLATÃO. Teeteto. Tradução de Carlos Alberto
Nunes. Belém: Editora Universitária, UFPA, 1988.
No texto
citado, Sócrates aborda o conhecimento como
(A) autoconstruído, a partir da
própria consciência do indivíduo.
(B)
convenções adquiridas pela educação e no convívio social.
(C) experiências construídas
a partir das nossas culturais.
(D) informações acumuladas visando obter prestígio ou riquezas.
(E) valores praticos ou morais, de natureza pessoal.
GABARITO: A
Comentário: Autoconhecimento, construído a
partir do uso da própria razão e não baseado em opiniões e preconceitos sem
julgamento racional.
QUESTÃO 3 (Habilidade: Articular conhecimentos filosóficos e
diferentes formas de linguagem.)
Nível de dificuldade: Difícil.
Assunto: Considerações
sobre o conhecimento.
Se os olhos não fossem solares
Jamais o Sol nós veríamos;
Se em nós não estivesse a própria força divina,
Como o divino sentiríamos?
GOETHE. In:
CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia.
São
Paulo: Ática, 2000.
O poeta alemão Goethe criou estes versos, tentando expressar como
os antigos concebiam o conhecimento. Segundo o texto, para os antigos,
(A) a luz é símbolo do
conhecimento e da revelação da verdade.
(B) a natureza reflete e reproduz o
conhecimento do homem.
(C) a natureza possui
inteligência comparativamente à do homem.
(D) o intelecto humano possui e conhece
a inteligibilidade do mundo.
(E) o sol ilumina nosso
intelecto e influencia nosso conhecimento.
GABARITO: D
Comentário: O intelecto humano conhece a
inteligibilidade do mundo porque a possui dentro de si. Citando Platão, somos
uma unidade, partes de um todo: “conhecer é lembrar”.
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